Alegrías
02.07.2021
04.09.2021
Alegrías é a segunda exposição individual de Pablo Accinelli (Buenos Aires, 1983), na Galeria. O título aponta para o mais animado dos estilos flamencos, cujo escopo musical é preenchido por conjuntos de batidas (e de palmas) que marcam fortemente – pela repetição ordenada – a sua estrutura, e também a cadência dos movimentos do corpo que dança. Pelo carácter festivo que emana, o estilo apela à partilha, ao encontro, à reunião social, à leveza que é própria da experiência da celebração. Podia dizer-se que, no âmbito expositivo que o artista apresenta, as Alegrías lhe servem de paradoxo e de pano de fundo: as obras não apenas sugerem a atmosfera do evento, como espelham, desde a origem, a exigência métrica, a repetição do gesto, por vezes exaustiva, que faz transitar certos elementos e aspetos entre obras e, assim, também as obras entre diferentes categorias (há esculturas que são pinturas, pinturas que são desenhos, etc.).
Concretamente, a exposição é composta por três momentos independentes e simultaneamente correlacionados. Nas paredes laterais, encontramos – expostos simetricamente, 7 de cada um dos lados – uma série de 14 desenhos de clips “avulsos”, dançantes, sobre papel milimétrico preenchido pela matriz um-sim-um-não, que confere ao desenho um inesperado aspeto táctil, a textura de um tecido bordado que coloca o desenho num espaço de transição categorial difícil de nomear. No plano horizontal, a escultura-fogueira ou um conjunto de pinturas tridimensionais, amplia a forma circular dos desenhos de clips (ou vice-versa), agora com 4,30 metros de diâmetro; um após o outro, os 60 sacos de carvão justapõem-se para formar o espaço de união social ou somente para pontuar a métrica da medição temporal, como acontece na contagem de um relógio tradicional – são fogueira e são relógio, escultura e pintura, não um em vez do outro, mas ambos em simultâneo. Por fim, tanto a forma circular da fogueira, como o conteúdo que a transforma, por exemplo, em objeto de medição do tempo, são espelhados na parede frontal, do ponto de vista de quem entra na galeria, pelo objeto, também ele circular, e também ele semelhante a um relógio – composto por furos na parede e por três varetas que podem muito bem revelar horas, minutos ou segundos –, aí exposto verticalmente e, assim, no plano que é tipicamente o de leitura da pintura ou do desenho, tratando-se este, no entanto, de um objeto de natureza profundamente táctil que, por isso, podia muito bem ser compreendido sem que fosse visto.
Maria Joana Vilela